sexta-feira, abril 23, 2010

O olhar de ti...

O olhar de ti...

Morto e desaparecido
Como um pôr do Sol
Faria tudo, se tempo tivesse tido
Para cair no olhar de ti

No olhar de ti
E no de mais ninguém
Contempla o mundo com o teu olhar
Vê as infames criaturas, como tu não há ninguém...

Mas o olhar de ti é tão perfeito
Brilhante e ofuscante
Por isso encosta a tua face ao meu peito
Para sentir que estás comigo

Mostra-me o sorriso de ti
Tão belo que devia ser pecado
Tão suavemente aliciante ao olhar, o sorriso de ti
Como se estivesse a sentir a carícia dos teus dedos nas minhas pálpebras

Faz soar a tua voz única
Tão docemente persuasiva
Tão cativante
Parece ondas de matéria corrosiva
(Demasiado perfeita para ser ouvida)

Os teus cabelos e os teus olhos
Conjugam como as estrelas e a lua
Se alguma alma quisesse ao meu lado
Seria para toda a eternidade a tua

Quem me dera olhar-te uma vez mais
Mas estou morto e desaparecido
Como um pôr do Sol
Se é que tenho valor para ser comparado com tal...

Tornas tão difícil o respirar...

segunda-feira, abril 19, 2010

Inferno Romântico Eterno

Tu és a água
A sacia dos cães
És a minha profunda mágoa

Tu és o feitiço da lua
O meu oculto desejo
Que tento abandonar na rua

Tu és a subtileza invulgar
Que proíbe o oblívio
Mesmo após me suicidar

Minha alma... deambulante e sofredora
Caída nos pensamentos obsoletos
De ninguém...

Apático Sofrimento

Paradoxalmente ignorando
Omitindo, a verdade
Ocultando o sentimento
Jorrando sangue, de ansiedade...

Não há prazo
Mas uma espera relativa, com um fim relativo...
Para ao acaso...
Balbuciar as palavras... de verdade...

As palavras na posse da verdade essas...
Que teimam em não sair
Frente à perfeição do teu ser!
Que me faz omitir!

Omitir é...
Não mentir...
Mas ocultar a verdade...
Reservar... nos confins da minha mente...
Que te quero...

Conceito de auto-ódio, desespero e fraqueza...

Porquê lavar o exterior do corpo...
Se o interior, bem... se mantém,
Eternamente sujo...
Exalando fedor até além

Porquê lutar por algo
Se o dom necessário para tal
Não existe na minha mente
Mas por favor, não me interpretes mal...

Porquê desistir de lutar,
Se a luta, de facto, ainda nem começou...
Pois o total ódio contra mim mesmo
Não o permite...

E encontro-me a suspirar
Sobre a imagem da perfeição
Que alimenta sem indício de fim
As trevas dentro do meu coração

A ignorância é um dom
É felicidade tal
Que te faz não pensares demasiado no que não merece tempo
Mas por favor, não me interpretes mal...

Aqui se encontra o termo...
O fim...
A morte...
Obscuramente adiantada...

Podridão

Podridão

A minha mente...
Sofre de uma demência
Que me deixa indecente
E como humano... humano?

Neste antro de miséria
As minhas pernas... encontram-se imóveis...
Os meus braços... debatem-se contra eles mesmos
Estando revestidos de heras inexoravéis

Na minha face apática
Caminham insectos
E por vezes, quase que em atitude enfática
Pequenos anfíbios...

As minhas sobrancelhas
Foram substituídas por musgo
Na minha cabeça caem-me detritos do tecto
Devido à ruína do sanatório em que me encontro

A minha boca
Eternamente aberta
Não como se estivesse a gritar
Mas porque nunca a fechei em toda a minha vida

E por nunca a ter fechado
Me encontro aqui...
Tenho pena de não me ter conformado
Quando ainda me mexia...

Na minha boca cai-me um líquido sedante
Já nem lhe sinto o sabor
Parece que nunca provei de outra coisa sequer...
Toma-lo é como respirar... é como sentir o calor

Se bem que calor ou frio
Já nem consigo distinguir
Pois em cima de acendalhas ainda a arder
Já nada consigo sentir, já nada me pode ferir

Nem sei como me podem considerar humano
A minha coluna vertebral
Está agora envolta em líquenes...
Mas quando nas minhas pernas nascem já margaridas, qual é o mal?

Um grupo de putos medíocres
No meu quarto tomou entrada
À minha face atiraram-me pedras
Gozaram, cuspiram e no meu peito, cravaram-me uma enxada

Foi por meros milímetros
Que não me acertaram no coração
E sempre que este bate
Sinto-o tocar nas extremidades da da enxada
E dói...

As minhas lágrimas caem verdes
Tomando a cor do musgo
Que substituiu também as minhas pestanas
E as lágrimas correm-me para a boca e têm um mau sabor

Mas vejamos pelo lado positivo
Há 15 anos que não sentia nenhum sabor diferente
Mas isso é subjectivo...
Um dos garotos acertou-me com uma pedra na boca

Eu engoli a pedra
Tinha fome!
Ela continha sal que se anexou às minhas feridas interiores
E agora dói-me ainda mais...

Ouvi o que me parecia ser um bando de ladrões
A entrar no sanatório
Entraram no meu quarto
Roubaram os azulejos e um objecto valioso e marmóreo

Nada custou-me ver partir
Excepto as minhas margaridas
Parece que quase por maldade me as roubaram
Que bem que elas cheiravam

Não há necessidade de tanta malvadez

Agora cheira-me a bafio
A ausência das belas flores
Preencheram-me o buraco
Que completava a mais profunda das minhas dores

Um réptil de dimensão média aproxima-se
Fita-me com olhos de predador
Aproxima-se de mim e morde-me o escroto
Morre de seguida, tão mau é o sabor...

Um lobo entra na minha divisão
Fita-me com olhos de compreensão
Deixa-me uma nota
E uiva de aflição

Não compreendi a aflição dele... nem liguei...
Apesar de eu ser extremamente míope
Consegui ver o que estava escrito na nota
Nela estava um número, o número 3

Por mais voltas que desse à minha mente
Não conseguia entender o porquê do número
De seguida entrou no meu quarto um roedor
Pousou-se em cima do meu braço direito, e esmagou-me o úmero

Com ele trazia outra nota
E nessa nota outro número
O número 2...
Depressa percebi que se tratava de uma contagem decrescente

Doente... mas inteligente...

Por esta altura voltavam-me a crescer flores nas minhas pernas
Parecia um ramo digno de funeral
Um ancião deu entrada no meu quarto
E deixou-me uma folha de jornal

Nessa folha encontrava-se um robusto número 1
E umas heras contorceram-se no meu pescoço
Sufocando-me quando eu já não sabia que mais me doía...
No meu quarto deu entrada o que parecia ser um moço

Bem enganado eu estava, a minha vista apenas piorara
Era um anjo, metade humano metade lobo
Agrediu-me, e atirou-me para o chão
Com chamas escreveu o número 0 no meu peito

Então o telhado desabou...